quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Um novo caminho para Unir e um novo caminho para a Amazônia

A Amazônia paga o maior preço pela entronização de um modelo de desenvolvimento centrado na extração e no processamento básico de recursos naturais, alimentando extensiva e intensivamente sua fornalha. O desmonte do licenciamento ambiental e do código florestal, além de medidas de regularização da grilagem e o subsequente sucateamento dos órgãos de controle e fiscalização têm por objeto a abertura ilimitada da fronteira de acumulação na Amazônia. Que significado tem uma política de portas abertas para o agronegócio, para a mineração e o setor energético em toda a região amazônica, sem o amadurecimento de salvaguardas e condicionantes sociais e ambientais?

Não se trata, portanto, de um processo de modernização em geral, é sim um particular processo de expropriação e de apropriação em larga escala conduzido de forma centralizada para servir a um modelo de destruição e decomposição da biodiversidade e sociodiversidade amazônicas. As chamadas “limpezas de área”, antes promovidas pelo coronelismo, se tornaram política de Estado na Amazônia.

A descaracterização da Amazônia e sua conversão em acervo, estoque de matérias primas e de energia, tem no Estado de Rondônia um pólo avançado de consolidação. Ponta-de-lança que foi dos famigerados programas de colonização e de incentivos fiscais nos anos 70 e 80, o Estado de Rondônia tornou-se palco para o relançamento dos grandes projetos de infra-estrutura na região. As usinas hidrelétricas instaladas no rio Madeira a partir de um licenciamento rebaixado, desconsiderando pendências técnicas estruturais e os interesses da população local, foram uma demonstração do método brutal de capitalização e apropriação territorial que seria depois aplicado em toda a Amazônia.

A Universidade Federal de Rondônia deveria ter um papel destacado no processo de revisão e avaliação desses processos desterritorializantes. E mais que isso, deveria reunir competência e quadros para assinalar outros cenários de dinamismo econômico e de diálogo social, resgatando e revitalizando fórmulas e experiências derivadas da singular trajetória da população do Estado. Nossa Universidade para tanto deveria ter suas prioridades de pesquisa elencadas a partir de um diálogo continuado entre a comunidade universitária e as organizações representativas da sociedade.

Ao contrário disso, o que se viu, em especial na suas últimas gestões, foi a fragmentação contínua dos escassos centros de pesquisa existentes e depois sua funcionalização nos marcos das agendas de instituições financiadoras, notadamente as mesmas grandes empresas impulsionadoras da devastação ambiental e da desestruturação dos modos de vida das comunidades tradicionais.

Afora isso, a captação de recursos e a execução orçamentária seguiu uma lógica canibalística com vistas a atender interesses particularistas, ao invés de estar a serviço de uma política articulada de ensino, pesquisa e extensão coerente com a necessidade de contrabalançar a dinâmica caótica de incorporação econômica do Estado e da região aos grandes negócios. A UNIR, nesses últimos anos, antes reproduziu as piores práticas inscritas na formação histórica do Estado, reproduzindo e multiplicando espaços de clientelismo, corrupção e privatismo. Autonomia universitária desperdiçada e leiloada. Esperamos que a partir das eleições no dia 01 de março possamos vislumbrar um novo rumo.



Prof. Luis Fernando Novoa Garzon
Departamento de Ciências Sociais da UNIR
Doutorando  IPPUR-UFRJ

3 comentários:

CARLOS SANTOS disse...

Caro Nóvoa: Seu texto nos remete à função que a universidade deve ter. Analisar o panorama, no caso o regional conectado tanto ao nacional quanto ao mundial, e fazer uma crítica dos rumos que tal realidade está tomando. Claro que o que tem balizado as políticas e os processos de intervenção na Amazônia tem sido a lógica de acumulação de capital a todo custo. Só que cada vez mais ganha relevância o paradigma ecológico (expresso no conceito de pegada ecológica). Isto é, o entendimento de que se dispomos apenas de uma natureza não podemos promover um crescimento exponencial, conforme o cânone (neo)liberal, temperado pelo conceito de substitutividade. A alternativa óbvia é o gerenciamento. A implicação maior do paradigma ecológico é a de que finalmente se tem um limite para o capital. Então, decorre que é fundamental uma nova postura científica, no sentido de se rever os discursos (as grades curriculares acadêmicas inclusive) científicos, reorientando-os para uma perspectiva de relação simbiótica e não mais de exploração predatória com a natureza. Esse é o desafio das universidades da região norte. Elas precisam assumir a Amazônia. Pra começar, é isso que comento. Este tema é muito rico. Mas estou sendo sintético. Quem sabe um seminário pra gente discutir melhor. Abraço. Carlos Santos

Marcelo Sabino disse...

Parabens Professor Nóvoa, pela clareza de idéias e por nos proporcionar uma reflexão da Universidade que precisamos e que muitos, e torço para que seja ao menos a maioria simples, quer.
Não consigo conceber um ambiente acadêmico tão, mas tão alienado e descolado de sua região como o que predomina na UNIR. Pouco se discute, pouco ou nada se contribui para a sociedade, seja em termos de manifestações, pareceres, defesa de patrimônio histórico, luta pela defesa de direitos que são, diariamente vilipendiados por grupos que estão há décadas (ou séculos) usurpando nossa cultura, nossa dignidade, nossa identidade. Parabens e que o Fórum seja um local para a promoção de debates e ações como as que seu texto nos remete. Obrigado.

Anônimo disse...

Caros Professores Carlos Santos e Marcelo Sabino, agradeço a generosa recepção do meu pequeno texto. Creio ser ponto pacífico a necessidade de aprofundar o debate sobre a especificidade das Universidades públicas na Amazônia e sobre o novo papel que precisam desempenhar. Com novos ares na nossa Reitoria, certamente teremos melhores condições para construirmos uma agenda de debates e seminários que norteiem nossa futura atuação docente e cidadâ. Que este Fórum se espraie, e se institucionalize no melhor sentido.
saudações fraternas
Luis Novoa